Carta do editor
O Brasil desmente a hipótese de que sairemos melhores da pandemia. E é para desmentir o Brasil que a serrote ganha sua primeira versão digital. ¶ Concebida em isolamento social, a revista interrompe a edição impressa para, em caráter excepcional, fazer circular o mais rápido e amplamente possível um instantâneo crítico de 2020. ¶ Sete ensaístas e três artistas visuais fazem aqui uma crônica possível do que vivemos hoje, entre a longa duração da história e o efêmero do noticiário, a angústia pessoal e a tragédia coletiva. ¶ Da abjeção dos métodos da extrema direita à delicadeza dos rituais do luto, constatamos que o peso do que nos oprime não esmaga a vitalidade de nossas resistências. ¶ No ensaio que abre esta edição, Carlo Ginzburg afirma que “o país a que pertencemos não é, como quer a retórica mais corrente, o país que amamos, e sim aquele do qual nos envergonhamos”. ¶ Talvez não exista hoje no Brasil um vínculo mais poderoso do que a vergonha. É em torno dela que temos a chance de nos unir – para dela nos livrarmos o mais rápido possível.
Paulo Roberto Pires