Carta do editor
De Montaigne a Bense
Separam Michel de Montaigne e Max Bense quatro séculos e, através deles, toda a história do ensaio. Do pensador francês, a serrote publica uma carta que é impressionante relato da agonia de seu melhor amigo, Étienne de La Boétie; do filósofo alemão, um dos textos que definem conceitualmente o gênero, até então inédito em português.¶ Não há de um para outro “evolução”, mas antes complementaridade: ensaio pode ser, sim, o texto em prosa que, como a carta, traduz uma experiência vivida e sobre ela reflete. E, também, como quer “O ensaio e sua prosa”, o híbrido entre poesia e prosa que não exclui a lógica na defesa enfática de seus pontos de vista.¶ É de corte montaigniano, portanto, o duro relato de viagem ao Brasil de 1974 por Elizabeth Hardwick, bem como o lirismo de James Thurber na memória de um cão de estimação da infância.¶ No sentido que lhe confere Bense, o de experimento e combinação, dão testemunho à reflexão de Jed Perl sobre o mercado da arte contemporânea e o diagnóstico necessariamente impreciso do “estado das coisas” por Jacques Rancière. ¶ Não são outra coisa senão ensaio as “anotações visuais” com que Antonio Dias preencheu um caderno nos anos 1960. Múltiplo em seus materiais – desenho, escrita, colagem –, o conjunto não resultou em uma obra ou fez parte de qualquer projeto. Foi e é, isso sim, espaço de pura experimentação entre o que Antonio viveu e pensou naquele momento e agora, quando decide publicá-lo pela primeira vez em meio a textos que participam, cada um a seu modo, da conversa infinita do ensaísmo.
Paulo Roberto Pires